A bandeira brasileira tem um velho e saudoso significado para mim. Lembra minha mãe com uma saia de linho verde que ela gostava de usar e a deixava elegante e charmosa. Mas um dia ela enroscou a saia em algum lugar, fazendo um rasgo irrecuperável. Ficou triste, muito triste. E para consolá-la pedi que me fizesse uma camisa com o tecido. Não é ela topou!
Mãos a obra. Sentada em sua Brivenix, uma máquina de costura inglesa, onde eu li as primeiras palavras na língua de Shakespeare: Made in England, ela costurou, em poucas horas uma bela camisa de linho verde. A cor me deixava preocupado, pois poderia sugerir que eu havia trocado de time, abandonando o velho clube do Parque São Jorge, mas eu gostava do verde e ponto final.
Mas um fato novo estava para acontecer. A minha professora do segundo ano primário avisou que no dia seguinte comemoraríamos o dia da Bandeira Nacional e nos fez decorar o quase desconhecido hino, cujos versos ainda me encantam: “Salve lindo, pendão da esperança/ Salve símbolo augusto da paz...”.
Assim, por estranho sentimento nacionalista, que naquela época eu ainda guardava, resolvi, substituir a camisa branca pela camisa verde e lá fui, orgulhoso com a principal cor da nossa bandeira e me posicionei na formação da classe para cantar o hino.
Estaria tudo certo, se a feroz professora Carmem, uma senhora que já devia ter os seus cinquenta anos ou perto disso, não tivesse um acesso de raiva, daquelas de sair fumaça pelos olhos e ventas. Ela, furiosa, me pegou pela orelha e me expulsou da fila, espumando de raiva. “Como você me aparece de camisa verde. Já para sua casa e não me volte aqui com essa camisa”.
Fiquei um pouco chateado com a expulsão e fui quase contrariado para casa. Quase porque até que não seria ruim passar a tarde em casa ou na rua jogando futebol ou fubeca. Doce ilusão. Ao chegar em casa dona Itanina não gostou nem um pouco da ideia e me arrastou novamente para o colégio. Lá chegando, para o meu desconforto, entrou feroz na sala da diretora, dona Rosa Basile, e fez um discurso que a deixou envergonhada.
Em seguida, acompanhado da diretora e minha mãe, também espumando de raiva, entrei vitorioso na sala de aula, de verde e tudo. Para completar meu dia de glória, minha mãe ainda colocou o dedo no nariz da dona Carmem e ainda disse: Eu vou manda-lo de camisa verde o dia que eu quiser e estamos conversados. Nunca mais fui com a camisa verde na escola, pois minha mãe resolveu botar panos quentes na história.
Enfim, não me lembro o que aconteceu com a camisa verde, mas do dia da bandeira e do ridículo papel da professora, nunca vou esquecer. Salve símbolo augusto da paz.
Num dia desses visitava um sebo para passar o tempo, quando, surpreso, vi o livro Comunicação Visual e Expressão, do professor José de Arruda Penteado. Comprei o exemplar e pus-me a recordar os tempos de faculdade em que ele era professor e nosso mentor intelectual. Era uma figura ímpar, com seu vozeirão impostado e uma fina ironia. Rapidamente estreitamos contato e nas sextas-feiras saíamos em turma para tomar vinho e conversar. Era um dos poucos professores em que era possível criticar, sem medo, a ditadura militar. Penteado era um educador, profissão que abraçara com convicção e paixão. Seu ídolo e mestre foi o grande pedagogo Anísio Teixeira, que ele enaltecia com freqüência em nossos encontros semanais. Defendia um modelo de educação voltado para uma prática socialista e democrática, coisa rara naqueles tempos. Depois disso, soube que estava coordenando o curso de mestrado em Artes Visuais da Unesp e ficamos de fazer contato com o ilustre e inesquecível mestre. Mas o t...
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