Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de 2010

UMA HISTÓRIA NATALINA

Pelo que eu me lembro, tinha vivido uns oito ou nove anos, mas foi um natal que continua colado em minha memória, como se fosse o único. Estávamos em dificuldades, principalmente porque meu pai resolveu ampliar a casa e desembocamos no Natal num canteiro de obras; o piso de terra e poeira por todos os lados. O pedreiro contratado e pago antecipadamente desapareceu, sem dar notícias. Nem móveis havia mais, pois parte deles ficou em outra casa. Papai, ajudado por mamãe tratou de montar uma mesa improvisada com uns cavaletes e tábuas da obra. Os bancos em volta da mesa eram tábuas sobre pilhas de tijolos e por isso era preciso muito cuidado para que não caíssem. Mamãe colocou um velho lençol branco sobre a enorme mesa e começou a colocar as iguarias de Natal. Era uma mesa simples, mas farta. Neste dia meu pai chamara um senhor que morava próximo para ajudá-lo, pois até no dia de Natal ele trabalhara duro para colocar a casa em ordem, pois estava sem recursos para pagar um profissional. Es

ALBUM DE RETRATOS E O VELHO RIO DE JANEIRO

Catete Estrada da Gávea                                                                    Revendo um velho álbum de retratos da família, encontrei  uma foto desgastada pelo tempo do meu tio Elisiário Ladeia  no longínquo ano de 1929. Era mês de julho e ele  posava numa fotografia para enviar de lembranças para a família que residia em Araçatuba, São Paulo. Com sua letra miúda e caprichada, ele escreveu: “Para o meu bom pai, uma lembrança do seu filho na Avenida Atlântica, capital da República”. Ele trabalhava como guarda-livros em um banco e morava na residência de um médico parente de minha avó. Guarda-livros era o nome que se dava para os contadores antigamente. Quando se contava a história lá em casa eu ficava imaginando que ele passava os dias tomando conta de livros, um bibliotecário. E lá estava meu tio em branco e preto curtindo as praias cariocas  enquanto o crack da  bolsa de Nova Iorque liquidava com  grandes fortunas.  Milioná

UM SUJEITO DE BEM COM A VIDA

Algumas pessoas se tornam lendárias em nossas memórias, principalmente aquelas que conhecemos em nossa juventude. É o caso do Ademir Bellucci, amigo dos tempos de faculdade. Era um sujeito de boa pinta, louro de olhos azuis, que fazia algum sucesso com as mulheres apesar de ser deficiente físico. Ele perdeu a mão quando garoto trabalhando em um açougue em sua cidade natal. Nunca se queixou com relação ao problema e ao contrário, gostava de brincar com a deficiência sem o menor constrangimento. Se alguém contava uma anedota de maneta, ele mostrava  o toco de braço e brincava com a própria desgraça. Fez isso com um amigo, o Erasmo, que chorou copiosamente ao ver que ele era maneta. As pessoas é que ficavam profundamente constrangidas com o seu defeito físico e muitas vezes ele, sem maldade,  tirava proveito dessa condição. Quando trabalhava no departamento de Estatística do Estado como estagiário, mostrava o toco e a chefe toda emocional, chegava às lágrimas quando ele contava, p

NEGÓCIOS E OPORTUNIDADES

Numa manhã ensolarada de primavera a campainha tocou. Era um casal bem apresentável. Ele de terno e gravata e ela vestida com uma saia e blusa bem combinadas. Pensei tratar-se de pregadores evangélicos, o que é muito comum nos fins de semana em meu bairro. Pediram-me um minuto de atenção. Dispus-me, educadamente, a ouví-los, considerando que estava de bom humor por causa do belo dia e pelas flores exuberantes do quintal. “Estamos fazendo uma oferta especial para pessoas de alto nível como o cidadão. Trata-se de um excelente lote no cemitério da Eternidade. É uma oportunidade única para pessoas que pensam no futuro”. Ao ouvir aquele discurso empolado e falso, desatei a rir. Tentei me conter, mas sem sucesso. O casal não entendeu nada e como não conseguia parar de rir, os dois deixaram um prospecto e foram embora, visivelmente irritados com a minha falta de cortesia. Na realidade a frase do vendedor não tinha  nada de engraçado, mas o fato é que me lembrei de uma pitoresca  história

A DESPEDIDA DO POETA (Delcy Thenório 1926-2010)

                                          Delcy Thenório com seu filho Edélcio Thenório O último encontro que tive com o poeta  Delcy Thenório, foi em sua casa em Santo André, para um café, tradição da família nos domingos à tarde. Foi um longo e prazeroso encontro. Conversou-se sobre tudo, até mesmo como preparar um bom café e quase todos os presentes se apresentaram como bons baristas, cada um com o seu jeito peculiar de preparar a bebida que é a preferência nacional. Até o Zeca, que todos sabem não conhecer os segredos de um bom café, deu lá os seus palpites. Boas anedotas correram soltas, sob o olhar distante da Antonieta que fingia entendê-las e esboçava um sorriso complacente. Falou-se muito de poesia e é claro, dos versos do Delcy, cuja sagacidade provocava gargalhadas descontraídas. Até o Elcio, seu filho, um bom vivant, presenteou-nos com um belo poema que compôs sobre a velha Itália. Surpreendeu a todos, ficando a leve suspeita de que os pendores poéticos são

CAFÉ LUÁ

Trinta anos sem o Café Luá O pessoal da velha guarda do ABC deve lembrar com saudade do velho Café Luá, na Rua Manoel Coelho, em São Caetano, no final dos anos 70. Era um misto de um café parisiense com bar carioca dos tempos da bossa nova. A arquitetura do espaço era bem concebida, com um mezanino de onde se podia avistar o palco, onde sempre bons músicos estavam lá para proporcionar aos freqüentadores o que havia de melhor na música popular brasileira. Os cafés servidos eram sofisticados e com uma imensa variedade, atendendo aos gostos mais refinados. E não faltavam os chás que podiam ser degustados pelos abstêmios ou após uma noitada pesada quando a madrugada dava os seus últimos suspiros antes dos primeiros raios de sol penetrarem pelas amplas janelas. O Zeca, sócio e idealizador do espaço era um perfeito anfitrião, estando sempre a postos para recepcionar os velhos amigos. Como o lema do Café Luá era “Até o último freguês”, isso lhe custou sérios problemas. O primeiro fo

MARIA DE FÁTIMA: UMA MULHER BRASILEIRA

Maria de Fátima, não era bonita, ou melhor, dizendo, estava mesmo mais para a feiúra do que para a beleza. Era magra, quase esquelética, usava óculos de aros escuros e muito pesados. Tinha dois filhos e era casada com um policial militar. Ela estava com quase trinta anos, quando resolveu voltar a estudar e mudar sua pacata vida de dona de casa. Fez o ginásio e o curso normal à noite, pois seu sonho era ser professora primária. Foi até longe demais para as suas condições, mas tudo isso teve o seu preço. Seu marido, no início, até que tolerou a decisão da mulher, mas aos poucos começaram os conflitos. Ele a acusava de abandono do lar para arranjar amantes na escola. Para ela ficava cada vez mais difícil cuidar da casa, dos filhos do trabalho e dos estudos que não pretendia abandonar. Um outro problema a deixava em conflito. O marido, desde há muito tempo, queria apimentar a vida sexual do casal e insistia, de toda forma, que ela concordasse em praticar sodomia, o que ela abominava. C

A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

A violência doméstica é uma constante em todas as camadas sociais e as residências das famílias são os locais mais perigosos para as crianças. Cerca de 30% das crianças são vítimas de maus tratos dentro da própria casa e seus algozes podem ser pai, mãe, padrastos, madrastas, tios, avós, irmãos etc. Infelizmente isso não é privilégio do Brasil. Também nos EUA e na Europa isso ocorre com freqüência quase semelhante. A história de Helenice faz parte deste quadro estarrecedor. Ela tinha o lado esquerdo do rosto deformado por uma grave queimadura. No trabalho ninguém ousava perguntar a causa, pois todos imaginavam que falar sobre o assunto causaria um sofrimento desnecessário à moça. Assim os colegas conviveram com ela durante meses fazendo de conta que não havia nada de diferente nela. Almoçavam juntos, participavam do happy-hour e tomavam o cafezinho na cantina e nada de se falar sobre o seu rosto. Mas um dia, durante o almoço, sem que ninguém houvesse tocado no assunto, ela desando

A CAMISA VERDE

A saia verde de minha mãe enroscou em uma cerca lá de casa e ela ficou desconsolada, pois gostava muito da peça. Era um linho verde de boa qualidade e muito bonito. Mas como ela era uma mulher muito prática, olhou bem para a saia e pensou na melhor forma de aproveitá-la. “Vou fazer uma camisa para você”. Achei o máximo ter uma camisa verde e aceitei de cara o presente. Como ela mesma sabia costurar combinamos qual seria o modelo. Depois de pronta, pensei eu, poderia fazer inveja aos meus colegas palmeirenses, apesar de ser, na época, um fanático corintiano. A camisa ficou tão supimpa que no dia seguinte, resolvi usá-la para ir à escola. Na época, no segundo ano primário, minha professora era muito rígida e furiosa. Ela usava um ponteiro de madeira com o qual batia nas cabeças e mãos dos alunos indisciplinados. Às vezes, em ataques de fúria, jogava até o sapato sobre as indefesas crianças. A escola era pública e da periferia de São Caetano do Sul e não havia a obrigatoriedade de utili

MENTIRAS

“Saber mentir é um gesto de nobreza pra não ferir alguém com a franqueza. Mentira não é crime, é bem sublime o que se diz mentindo pra fazer alguém feliz " (Noel Rosa) Mentira tem perna curta, diz o adágio popular. Será mesmo? Muitas mentiras atravessam séculos sem nunca serem desmentidas. Pois é, não foi recentemente que pesquisadores comprovaram que Joseph Stalin fez um acordo secreto com Hitler para a invasão da Polônia? Já faz mais de setenta anos e a mentira ficou embaixo do tapete todo esse tempo. Mas a verdade é que todos mentem, uns mais outros menos. Políticos então mentem sempre que for necessário para os interesses do Estado, do poder e também pessoais. Maquiavel, que não era necessariamente maquiavélico, escreveu que um Príncipe deve mentir ou falar a verdade, mas ser sempre honrado. A ética do poder tem lá suas razões para permitir a mentira. O pensador florentino sabia das coisas e se baseava em exemplos históricos em que os soberanos incapazes de cometer

A MEMÓRIA

Não há nada mais extraordinário e complexo do que a memória. Somos um imenso arquivo de idéias, fatos, imagens, rancores, alegrias, odores, sons, músicas, conhecimentos, enfim, tudo o que podemos registrar através dos nossos sentidos. Ao longo de uma existência vamos construindo uma imensa biblioteca virtual. É realmente um mundo fantástico. Nossa capacidade memorizar parece ser infinita, mas com o passar dos anos, vamos gradativamente perdendo essa dádiva que a vida nos dá. Sem memória não somos nada. É a memória que possibilita a nossa existência como “homo-sapiens” e que tornou o ser humano um animal dominante, presente em todos os espaços do planeta. Nós somos, concretamente, a nossa memória, que foi agregando ao longo de nossa existência, a capacidade de ler, escrever, recordar informações, fatos, imagens, odores, alegrias, tristezas etc. Aos poucos, com o avançar da idade vamos esquecendo nomes de pessoas conhecidas com as quais temos contatos menos frequentes. Nomes de artist

CINE ÁTILA, O MEU CINE PARADISO

O CINE ÁTILA E O CINEMA PARADISO Também tive o meu cinema Paradiso, mesmo sem os encantos e a poesia de uma pequena cidade italiana, onde o diretor Giuseppe Tornatore desenvolve sua trama. O filme traça a trajetória de um garoto apaixonado por cinema tendo por pano de fundo uma humilde sala de exibição nos anos cinqüenta. Ali se desenvolvem vários dramas humanos, conflitos de classe, choques culturais com a influência norte-americana através dos filmes, relações afetivas etc. As minhas primeiras viagens ao mundo do cinema foram em um velho pulgueiro chamado Átila, na Vila Gerty, bairro periférico de São Caetano do Sul. Pulgueiro era como se designava os cinemas mal frequentados e não muito limpos. Lá, quase todos os domingos, eu ia com minhas irmãs mais velhas assistir às matinês. Era uma festa de emoções e surpresas. O aroma de pipoca embriagava minha mente inquieta enquanto aguardava na fila a abertura da porta que possibilitava a entrada no mundo dos sonhos. Eram duas sessõe

A ROCA DE FIAR

Sempre que visitava antiquários, gostava de ficar observando as antigas rocas de fiar e imaginando que uma delas poderia ter sido de uma das minhas bisavós e até fiquei tentado a comprar uma para deixá-la como relíquia lá em casa. Por sorte, uma amiga de longa data, a Luci, ligou um dia desses avisando que tinha um presente para nós, que ficaria muito bem em nossa casa. Para minha surpresa, era uma roca de fiar, muito antiga, que ela ganhou de presente. Seu patrão se desfez de uma fazenda e ofereceu a ela, entre outros objetos, uma roca, que ela gentilmente nos presenteou. Hoje uma centenária roca de fiar está presente em nossa casa e, além de servir como objeto de decoração, é a alegria do Tom, meu neto, que fica encantado ao girar a roda da roca. Para ele é um divertimento quando vem nos visitar e passa algumas horas em nossa companhia. Ele grita e ri de modo a ouvir-se de longe, como se a roca fosse a máquina do mundo. Recordo-me, quando criança, que minha mãe contava história

AS GUERRILHEIRAS

Nos anos setenta conheci uma guerrilheira que utilizava o codinome Rosa. Era uma moça afável e meiga. Era alta e tinha um corpo roliço e um pouco gordinha. Eu era estudante secundarista, ainda adolescente e ela já havia iniciado uma faculdade que não me lembro qual. Entre suas leituras preferidas havia um escritor considerado reacionário, o russo Boris Pasternak, autor do romance Doutor Jhivago, que é a história de um poeta e médico que perde o encanto pela revolução depois que ela atinge a sua vida pessoal. “A vida pessoal acabou na Rússia”, era a fala de um personagem revolucionário, Stenicoff no filme homônimo. Fiquei triste ao ler o livro e descobrir que o roteirista inventou a frase. Mas até hoje não entendi porque a Rosa me emprestou um livro de filosofia do Pasternak, um escritor católico conservador, sendo ela ligada a uma corrente revolucionária chinesa, super radical. Outra que conheci era de um movimento trotskista que também acabou optando pela luta armada. Essa era fei

O APAGÃO

De repente as luzes começaram a se apagar e a escuridão invadiu todos os espaços, esparramando-se pelas avenidas, praças, vielas, prédios e quintais como uma nuvem que desceu dos céus. Mas aos poucos algumas pequenas e tímidas luzes foram surgindo e tive a sensação de que voltávamos para o século XIX, antes da eletricidade ser trazida pelos ingleses. Foi como se aos poucos, depois do susto inicial, as pessoas estivessem saindo do estado de letargia ou preguiça tecnológica e começassem a buscar soluções para o caos. As velhas, antiquadas e poluidoras velas de parafina, com cheiro de velório, sempre presentes nas gavetas como lembranças de outros apagões, ganharam a cena e ajudaram as pessoas a se olharem numa outra perspectiva. Os penteados, as maquiagens, as roupas, deixaram de ter importância. O que passou a valer de verdade foram as vozes, as palavras, os gestos que se faziam presentes como num teatro de sombras. As ruas da Vila Madalena, reduto boêmio da cidade estavam salpicada
OS ÓCULOS Os óculos fazem parte das pessoas, é um objeto que integra a personalidade dos indivíduos que utilizam. O jeito de arrumá-lo no rosto, de limpá-lo, de olhar... Usar óculos torna as pessoas mais cautelosas, controladas e até mais elegantes.       Escrevo sobre os óculos porque encontrei, ao remexer velhos papéis, velhos livros, antigas gavetas, os que pertenceram ao meu pai. Estavam velhos e desgastados pelo tempo, mas ao tocá-los senti uma vibração como se estivesse tocando  algo vivo e não uma coisa inerte constituída de plástico, metais e lentes de cristal, além do trabalho humano, nele impregnado. Ele foi usado ao longo de muitos anos e viu muita coisa passar pelas suas lentes. Durante anos, todas as manhãs, após o café, com eles ia até o portão e observava os transeuntes, amigos e desconhecidos. Via as rugas que marcavam seus antigos companheiros, via as crianças que passavam ao colo de mães que eram filhas ou noras de seus amigos. Viu velhos conhecidos e amigos pa
A MOENDA Dona Elisa morava na casa em frente a nossa. Meus pais achavam que ela não regulava bem da cabeça, pois falava sozinha, andava vestida de modo estranho e gostava muito de crianças. Quando eu digo que ela gostava de crianças estou me referindo a brincar como criança, conversar ou agir como tal. Uma vez ela reuniu várias crianças da rua e, para desespero dos pais, levou todas para um longo passeio. Lembro-me que fomos até uma rodovia, distante uns dois quilômetros de nossa casa. Até lá fomos passando por locais incríveis para os meus olhos de menino, que conhecia aquela paisagem de forma bem distante. Meu olhar sonhava aquelas paragens e eu pude descobrir que tudo aquilo era maior do que o meu olhar. Na volta, depois de algumas horas, todos cansados, mas felizes, recebemos uma repreensão dos pais, que estavam todos reunidos na esquina à espera da “raptora” de crianças. Pobre dona Elisa, precisou ouvir o que não queria do seu marido, o seu Sebastião, um homem muito sério e sisud

SAULO DE TARSO: O MAIOR DO BRASIL

Ele nasceu em Minas Gerais, de família grande e musical. Quase todos tocavam algum instrumento. Avós, tias, tios e ele não poderia fugir à regra. Aos nove anos já tocava cavaquinho e depois, para abraçar o violão, foi só uma questão de tempo. Mas Minas, apesar das montanhas, da couve refogada, do tutu e do torresminho, não dava mais. “Minas já não há”, disse num poema o poeta de Itabira. E por isso, a família Azevedo, de mala e cuia, não viu outra saída e, como bons mineiros, não perderam o trem. Malas de couro forradas, a mãe até a porta, os amigos até a estação e assim a família foi deixando um rastro de saudade, de lembranças, histórias e canções. Com apenas quatro anos, ele caminhou com as suas próprias pernas pela estrada poeirenta até chegar à estação de trem. A mãe contava, de cinco em cinco minutos, se todos os cinco filhos estavam lá. E foi uma viagem longa, a maior que eles já tinham feito na vida. São Paulo era um mundo novo, cheio de esperanças e oportunidades. Mas

COPA DO MUNDO

Era ainda criança e não entendia bulhufas de futebol, mas sabia que o Brasil estava enfrentando os seus mais ferozes inimigos. Meu pai bradava e esmurrava o radio que ficava sobre um aparador fixado na parede. Seu rosto ficava vermelho e tenso e dava a impressão de que teria um surto a qualquer momento. Enfim, terminada a partida, ele se sentiu aliviado e ria como uma criança que ganha um novo brinquedo. Era um dia bonito e ensolarado de inverno e todos os vizinhos saíram para a rua para comemorar. Alguns soltaram fogos e o compadre do papai, seu Luiz Marson , havia feito um belo balão verde e amarelo para soltá-lo depois da vitória na final. O balão subindo foi apoteótico. Todos vibraram e acompanharam o balão até que ele desaparecesse no céu azul. Meu pai contava histórias sobre a copa de 1950, quando o Brasil perdeu para o Uruguai na final, em pleno Maracanã . Lá em Lavínia , interior de São Paulo, meu tio Agripino atirou o rádio no meio do mato de tão furioso que ficou. Inf