UMA CACHAÇA DA BOA
Já estava perto do horário de
almoço, quando chegou ao balcão do bar um homem de uns quarenta anos, se muito.
Bem educado, perguntou pro Manoel, proprietário do bar se ele tinha uma cachaça
da boa, daquelas de alambique pequeno, artesanal. “Mas tem que ser da boa
mesmo, pois na minha terra é que tem cachaça de verdade. Sou lá de Minas,
Salinas, a terra da cachaça, conheces”?
Manoel não conhecia Salinas, mas
tinha uma cachaça de um fornecedor pequeno, mas de excelente qualidade, explicou
orgulhoso. “Só ofereço pra quem entende, não é pra qualquer gajo”, disse no seu
sotaque lusitano pegando uma garrafa na prateleira.
- Se é boa mesmo, então pode
servir que eu quero provar, disse o estranho.
Ao encher o cálice, o aroma da
cachaça impregnou o ambiente, deixando o homem entusiasmado. Nisso ele oferece
a bebida para uns três frequentadores do bar, que prontamente aceitaram a
oferta, diante do olhar incrédulo do Manoel.
- Pode servir, por favor. E faço
questão que o senhor também brinde com a gente. Mais um copo para o senhor.
Manoel que não era dado a beber
no trabalho ficou desconfortável, mas diante da insistência do cavalheiro aquiesceu.
Brindaram e saborearam a boa cachaça, cuja garrafa custava três vezes o preço
da comum. Terminado o brinde, o homem simplesmente agradeceu ao dono do
estabelecimento e saiu sob o olhar estupefato de Manoel que ainda ameaçou
gritar para sujeito.
No dia seguinte, na mesmo horário
lá estava o homem novamente. Encostou a barriga no balcão, cumprimentou a todos
e perguntou para Manoel: “Ainda tem daquela cachacinha boa”? Manoel pensou duas
vezes na resposta e já ia dizendo: “Tem, mas pra quem pode pagar”, mas ficou só
no pensar. Com os bofes remoendo respondeu secamente: “Ainda tenho cá, mas é
muito mais cara”.
Pois então sirva pra nós e faço
questão que o senhor também tome um trago, pois é merecido. Manoel engoliu a
seco e repetiu o mesmo ritual do dia anterior servindo para os outros fregueses
e para si mesmo. O homem levantou o brinde e bradou: “Saúde pra todos”.
Agradeceu e já ia saindo do bar quando Manoel o alcançou e disse lá alguns
impropérios. O homem, muito educadamente pediu que ele se acalmasse e que não
havia necessidade de exaltação. Mesmo
assim, não pagou e seguiu seu caminho para o desgosto do velho português.
Mas no terceiro dia, eis que
novamente o cavalheiro aparece à porta do estabelecimento, tira o chapéu,
cumprimenta a todos e pede novamente a prestigiada cachacinha. Manoel se
preparou para o pior. Hoje esse sujeito não me escapa, pois, pois.. pensou lá
com seus botões. A cachaça foi servida ao homem, que ofereceu para uns três ou
quatro, que aceitaram prontamente. Afinal não era sempre que tinham a
oportunidade de saborear uma iguaria como aquela.
Faltava apenas oferecer ao
Manoel, quando o homem disse bem humorado: “Pro senhor não, pois quando bebes
ficas muito bravo.”.
E mais uma vez saiu em direção à
porta, sem pagar a conta.
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