Escrever um livro, ter um filho e plantar uma árvore são os passos necessários para se tornar um homem de verdade, diz o velho aforismo. Poucos são aqueles que podem cumprir todas essas tarefas. Para quem mora em apartamento plantar uma árvore deve ser um desafio maior do que escrever um livro. Ser pai, salvo em casos de problemas de natureza biológica, parece ser o mais fácil de todos. Mesmo assim a adoção pode resolver o problema, pois o que importa é ter um filho, criá-lo, educá-lo, mesmo que tenha sido gerado por outro. Agora escrever um livro, não é coisa para qualquer um. É preciso ter inspiração e sobretudo muita transpiração, principalmente se o sujeito resolver criar uma obra de ficção, com personagens coerentes e verossímeis.
Começo essa conversa fiada para falar do nosso velho amigo Luiz Carlos Erasmo da Silva. O Erasmo foi uma alcunha que recebeu nos tempos da Jovem Guarda pela sua semelhança com o músico Erasmo Carlos companheiro inseparável do Roberto Carlos. O apelido pegou para sempre e são poucas pessoas que o conhecem que sabem o seu verdadeiro nome. Aliás aproveito a oportunidade para sugerir que ele incorpore o Erasmo ao nome oficialmente como fez o nosso primeiro mandatário. Pois bem, o nosso querido Erasmão escreveu um livro e depois de tantas idas e vindas, conseguiu enfim publicá-lo para a posteridade. O livro é a história de um valente peixinho nas águas do velho e maltratado Tietê. É uma história gostosa e bem humorada que conta as peripécias de Piray, o douradinho irreverente , uma aventura no Tietê.
O Erasmo é um tipo bonachão, simpático, agradável e dono de um papo delicioso. Seu carisma é reconhecido em todos os lugares por onde anda. Suas imitações do Rei do Rock, Elvis Presley eram memoráveis e é bem provável que ele preferiria ter o apelido de Elvis e não de Erasmo. Além disso, o Erasmo Carlos envelheceu, ficou de cabeça branca e com rala cabeleira. Enquanto isso, o nosso Erasmo continua com sua vasta cabeleira ainda na cor original (salvo se freqüenta, na calada da noite, algum cabeleireiro para tingir as suas madeixas). O que está atrapalhando um pouco a sua ainda jovial aparência, apesar de ser um sessentão, é sua protuberância abdominal um pouco exagerada, resultado de bons copos de cerveja saboreados no calor de boas conversas com os amigos.
A publicação do livro, cujas cópias já circulavam entre os amigos mais chegados, é o coroamento de uma vida de um sujeito realmente porreta, cuja integridade é posta a toda prova. Erasmo é o sujeito do qual pode-se comprar um carro usado sem riscos, pois é capaz de perder dinheiro a arriscar uma boa amizade. Apesar de corpulento, é um menino chorão, que se emociona com bastante facilidade. Lembro-me que uma vez em minha casa, durante a festa de aniversário da Celinha, estava também um amigo que não tinha a mão direita, perdida por um acidente de trabalho. Sem perceber a deficiência física do Ademir, que conheceu neste dia, o Erasmo contou uma piada de maneta. Ao concluir, todos riram e o Ademir, muito gozador, mostrou-lhe o toco do braço dizendo: “Ele era assim?” Foi uma tragédia, pois o nosso amigo foi encontrado depois de muito tempo chorando copiosamente nos fundos do quintal e só se acalmou depois que o Ademir o convenceu de que não havia ficado chateado com a piada e que gostava de brincar com sua deficiência.
O Erasmão, o nosso querido Escritor, é assim, alegre divertido que gosta de fazer as pessoas rirem, mas é também um chorão que chega às lágrimas com facilidade. Mas é uma pessoa determinada e vai em busca dos seus objetivos e não importando as dificuldades que possa encontrar pela frente. Com o seu livro embaixo do braço perambulou anos atrás de editoras e patrocinadores, tentando convencê-los da importância da obra para a preservação da memória ecológica do nosso país através da sensível história de um peixinho.
Como ele não teve filhos, faltando assim o último item para completar a trilogia necessária para ser considerado um “grande homem”, penso que por enquanto o Pirahy deve assumir o posto. Afinal, é um personagem concebido com amor e carinho. É o que basta para ser um bom pai. Quanto ao filho biológico é uma questão de tempo, pois até os noventa o Erasmão pode surpreender a todos nós. Quem viver verá!
Renato Ladeia
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