QUEM NUNCA ENGOLIU UM
SAPO?
A expressão
engolir um sapo significa simbolicamente que se trata de aceitar alguma
coisa não digerível ou contra a vontade. Quem nunca engoliu um sapo no
trabalho, na família, nas salas de aula ou nos grupos de relacionamento?
Passamos a vida engolindo sapos e lagartos, mas que foram necessários para a
sobrevivência ou para a manutenção da paz, mesmo que forçada.
Na política isso
é mais comum se engolir sapos do que fazer política no seu estrito senso.
Resgatando um pouco da história, o velho Luiz Carlos Prestes, fundador do
Partido Comunista no Brasil, teve que engolir um tremendo sapo ao concordar,
por uma decisão partidária, a apoiar o Getúlio Vargas nas eleições de 1950.
Justo o algoz que mandara para a câmara de gás a sua esposa grávida, Olga
Benário. Eu diria que não foi um sapo e
mais apropriado seria dizer um porco espinho.
Mas os políticos
acabam esquecendo tudo. Quem acompanhou as eleições de 1979, há de se lembrar
de que o Collor colocou na televisão a ex-namorada do Lula, dizendo que ele
queria que ela fizesse um aborto (o que não aconteceu). Sem isso o Collor
talvez não tivesse vencido as eleições. O sapo foi o Lula, tempos depois, já
presidente, precisar do apoio do Collor e posar com ele numa foto sorridente.
Outro sapo que o mesmo Lula precisou engolir foi nas eleições paulistanas de
2014. Precisando do apoio do Maluf, seu “inimigo” histórico, mandou o recado
pedindo apoio. O Maluf topou, mas com
uma condição: “topo desde que o Lula venha até minha casa com o seu candidato
(Haddad) e com a presença da imprensa”. Como o partido é maior do que as
pessoas ou seus interesses pessoais, o Lula engoliu outro sapo.
Laudo Natel,
antigo político paulista foi um que não conseguiu engolir o sapo. Candidato
escolhido pelos militares para governar São Paulo, foi atropelado por Paulo
Maluf que agindo sorrateiramente, conseguiu o direito de sair candidato pela
Arena, manipulando o colégio eleitoral.
Natel se recusou a cumprimentar Maluf, mas os militares engoliram o sapo
por ele e o “turco” foi eleito indiretamente e tomou posse.
Como todos tem
uma história de sapos engolidos, pelo menos simbolicamente, contarei o meu sapo
engolido. Nos tempos de faculdade
convidamos um intelectual nacionalista chamado Moniz Bandeira para uma palestra.
Como estávamos em plena ditadura as pessoas viviam pisando em ovos com receio
de dizer ou até pensar em algo que pudesse suscitar a ira dos poderosos. O
palestrante foi recebido pelos professores do departamento que assumiram a
mesa. Antes de dar início a palestra, um professor conhecido por suas ideias
reacionárias, avisou a plateia que não haveria debate e as perguntas deveriam
ser feitas por escrito e encaminhadas a ele que tomaria a decisão de encaminhar
ou não para o convidado. Revoltado contra o cerceamento às liberdades, me
levantei e protestei, ameaçando sair do auditório. Esperava que a maioria se
levantasse, mas apenas eu e a Celinha ficamos em pé. O que fazer? Fazer a
retirada ou permanecer no auditório? O Moniz Bandeira me ajudou a engolir o
sapo, pedindo encarecidamente para que eu permanecesse. Sentamo-nos e lá permaneci sem olhar para os
lados, constrangido pelo vexame.
Um amigo, fiel
às suas ideias liberais mais para centro direita, abominava as ideologias de
esquerda por pregarem a implantação da ditadura do proletariado e um estado
totalitário à semelhança da antiga URSS ou da China. Pai de uma única filha
esperava que seguisse a sua carreira de engenheiro, mas eis que essa se
envereda para as artes e entra numa universidade pública. Não demorou muito
tempo descobriu que a filha já havia sido seduzida pela narrativa
revolucionária do PSOL. Mas como bom e generoso pai prontamente engoliu o sapo
e se preparou para manter um diálogo franco com a filha, sem ressentimentos.
Mas a mais estranha
história de sapo me foi contada por uma moça quando falávamos sobre “engolir
sapos” numa roda de amigos. Narrou que passava as férias na fazenda de seus
avós quando ela e suas irmãs descobriram, ao acaso, um saco de açúcar mascavo
na dispensa. Como o açúcar estava empedrado, acharam uma delícia chupar os
torrões com sabor que lembrava a deliciosa garapa. Mas ela, uma “formigona”, pegou mais um
torrãozinho e o levou escondido à cama para deliciar-se enquanto esperava o
sono. Como o torrão não acabava nunca o colocou sob o travesseiro e adormeceu.
No dia seguinte ao procurar a iguaria, vejam o que ela viu: um sapinho
mumificado que morreu no tanque de melado quente, provavelmente há muitos
quilômetros dali.
Essa
literalmente chupou um sapo ao invés de engoli-lo e só não o fez por causa do
sono, pois caso contrário teria devorado o sapinho aos pedaços adocicados pelo
açúcar. Mas engolir literalmente um sapo foi obra de uma cadela pastor Alemão que
tínhamos em casa. Ao ver um sapinho pulando alegremente no quintal, ela abriu
sua boca enorme e ficou esperando a presa. O sapinho caiu na sua boca e ela o
degustou imediatamente. Esse sapo nos custou uma noite de sono, pois
preocupados com o risco de envenenamento, corremos ao hospital veterinário para
evitar o pior. Não deu nada e a cadela viveu por muitos anos depois de ter
engolido um sapo.
E vocês, teriam
alguma história de sapo para contar?
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