Abotoou o paletó ou a história moderna da vestimenta, uma analogia ao De Pallio de Tertuliano
Ao encontrar o amigo Zéca, despudoradamente, sem paletó no casamento do filho de um amigo, brinquei com a sua falta de “compostura”. Onde já se viu ir a um casamento sem paletó e gravata? Diante do seu sorriso matreiro, insisti que um paletó era uma indumentária essencial. Afinal, mesmo para partir desta para melhor, é preciso de um. O amigo riu da observação, mas continuou achando que a clássica peça do vestuário masculino era desnecessária e excessivamente burguesa para o seu gosto. E ainda avisou que contaria comigo para o caso de precisar de tal peça para o enterro. “Depois a gente se acerta no purgatório”, completou se divertindo.
Essa conversa me conduziu à infância e me fez lembrar de um presente que meu pai deu a cada um dos meus dois irmãos menores. Era uma pequena gaita de plástico, uma coisa sem muita importância. Entretanto, aquilo me magoou profundamente. Ao perceber o meu desapontamento, meu pai explicou que aquilo era um pequeno brinquedo de criança e que eu já estava ficando mocinho e precisava de um presente melhor, um terno, por exemplo. Respondi que ternos não serviam para brincar e que preferia ganhar uma gaita. Foi então que meu pai disse que um homem precisa de pelo menos um paletó, mesmo que seja para morrer. O velho gostava de contar suas histórias e disse: “Sente aqui que eu vou lhe contar a razão”.
A história era de um sujeito que não nunca se preocupou em ter um bom terno. Gastava seu dinheiro em divertimento, bebidas, passeios e presentes. Quando alguém lhe falava que ele não tinha um bom terno, nem para morrer, respondia: “Não se preocupe, pois quando eu morrer alguém me empresta um paletó. Uma gravata eu já tenho”. E foi o que aconteceu algum tempo depois. Muito mal de saúde, o sujeito teve uma última conversa com um dos seus velhos companheiros e pediu emprestado um paletó para o seu enterro. “Mas você me devolve, não é?”, disse o amigo em tom zombeteiro. “Com toda certeza eu vou devolvê-lo”, respondeu o moribundo.
Alguns dias depois, com a notícia da sua morte, o amigo preparou seu único terno de casimira inglesa, bem cortado, estilo jaquetão, escovando e passando a ferro para deixá-lo impecável para as exéquias do companheiro. O defunto ficou bonito de se ver. A barba bem feita, cabelos bem penteados e um bom terno que causou admiração a todos que foram ao velório, pois nunca haviam visto o homem tão bem vestido. “Pelo menos para a última viagem ele se aprumou” diziam todos que por lá passavam.
Chegando ao céu, o Gaspar - era assim que ele se chamava - foi muito bem recebido, pois era um bom cristão, mas foi avisado de que deveria devolver o terno ao amigo, pois promessa é dívida, mesmo depois da morte. Foi então que o pobre Gaspar tirou o terno e vagou, por anos da eternidade, passando frio e fome com a roupa na mão para devolvê-la ao seu benfeitor. Como o encontro se daria na eternidade, Gaspar precisou esperar a morte do amigo para devolver o terno. Foi com espanto que a família do morto viu, sobre uma cadeira, na manhã seguinte, depois de uma noite de velório, o velho terno de casemira.
Esta história me deixou arrepiado e quase não dormi a noite, aterrorizado com a possibilidade de morrer sem um terno. No dia seguinte procurei meu pai e disse: “Pai, eu vou querer um terno”. “É assim que se fala meu filho”, respondeu o velho, feliz por ter me convencido da importância de se ter um bom costume para usar em ocasiões especiais.
O meu primeiro terno ou costume, já que tinha apenas duas peças, era de calças curtas cor cinza e com riscas de giz. Tirei com ele algumas fotos e fui à missa algumas vezes, ostentando uma gravata borboleta, bem ao estilo da época. É claro que tive outros e sempre era uma história no momento da compra. Minha mãe muito zelosa com as economias domésticas pechinchava exaustivamente para conseguir um bom desconto. Meu pai, ao contrário, não gostava de ser visto com um sovinha e achava que o preço sempre estava adequado.
Meu pai durante toda a sua vida, sempre se preocupou em ter bons ternos para usá-los nos passeios ou mesmo para ir ao centro da cidade para resolver algum assunto cotidiano. Não importava o calor que fizesse, ele suportava elegantemente o paletó e a gravata apertada no pescoço. Muitos anos depois resolvi presenteá-lo com um terno em meu alfaiate. Pedi que escolhesse o melhor tecido disponível no Seu Benedito alfaiate. Esse terno era seu orgulho e pediu-me, discretamente, que queria ser enterrado com ele. E assim se fez. No dia de sua morte fui buscar em sua casa o terno e escolher uma gravata para a sua última viagem. Ao vê-lo bem arrumado no seu último descanso, lembrei-me da história que havia me contado. Bem, e se realmente existir o paraíso, ele não precisará devolver a roupa, como aconteceu com o tal de Gaspar.
Ao encontrar o amigo Zéca, despudoradamente, sem paletó no casamento do filho de um amigo, brinquei com a sua falta de “compostura”. Onde já se viu ir a um casamento sem paletó e gravata? Diante do seu sorriso matreiro, insisti que um paletó era uma indumentária essencial. Afinal, mesmo para partir desta para melhor, é preciso de um. O amigo riu da observação, mas continuou achando que a clássica peça do vestuário masculino era desnecessária e excessivamente burguesa para o seu gosto. E ainda avisou que contaria comigo para o caso de precisar de tal peça para o enterro. “Depois a gente se acerta no purgatório”, completou se divertindo.
Essa conversa me conduziu à infância e me fez lembrar de um presente que meu pai deu a cada um dos meus dois irmãos menores. Era uma pequena gaita de plástico, uma coisa sem muita importância. Entretanto, aquilo me magoou profundamente. Ao perceber o meu desapontamento, meu pai explicou que aquilo era um pequeno brinquedo de criança e que eu já estava ficando mocinho e precisava de um presente melhor, um terno, por exemplo. Respondi que ternos não serviam para brincar e que preferia ganhar uma gaita. Foi então que meu pai disse que um homem precisa de pelo menos um paletó, mesmo que seja para morrer. O velho gostava de contar suas histórias e disse: “Sente aqui que eu vou lhe contar a razão”.
A história era de um sujeito que não nunca se preocupou em ter um bom terno. Gastava seu dinheiro em divertimento, bebidas, passeios e presentes. Quando alguém lhe falava que ele não tinha um bom terno, nem para morrer, respondia: “Não se preocupe, pois quando eu morrer alguém me empresta um paletó. Uma gravata eu já tenho”. E foi o que aconteceu algum tempo depois. Muito mal de saúde, o sujeito teve uma última conversa com um dos seus velhos companheiros e pediu emprestado um paletó para o seu enterro. “Mas você me devolve, não é?”, disse o amigo em tom zombeteiro. “Com toda certeza eu vou devolvê-lo”, respondeu o moribundo.
Alguns dias depois, com a notícia da sua morte, o amigo preparou seu único terno de casimira inglesa, bem cortado, estilo jaquetão, escovando e passando a ferro para deixá-lo impecável para as exéquias do companheiro. O defunto ficou bonito de se ver. A barba bem feita, cabelos bem penteados e um bom terno que causou admiração a todos que foram ao velório, pois nunca haviam visto o homem tão bem vestido. “Pelo menos para a última viagem ele se aprumou” diziam todos que por lá passavam.
Chegando ao céu, o Gaspar - era assim que ele se chamava - foi muito bem recebido, pois era um bom cristão, mas foi avisado de que deveria devolver o terno ao amigo, pois promessa é dívida, mesmo depois da morte. Foi então que o pobre Gaspar tirou o terno e vagou, por anos da eternidade, passando frio e fome com a roupa na mão para devolvê-la ao seu benfeitor. Como o encontro se daria na eternidade, Gaspar precisou esperar a morte do amigo para devolver o terno. Foi com espanto que a família do morto viu, sobre uma cadeira, na manhã seguinte, depois de uma noite de velório, o velho terno de casemira.
Esta história me deixou arrepiado e quase não dormi a noite, aterrorizado com a possibilidade de morrer sem um terno. No dia seguinte procurei meu pai e disse: “Pai, eu vou querer um terno”. “É assim que se fala meu filho”, respondeu o velho, feliz por ter me convencido da importância de se ter um bom costume para usar em ocasiões especiais.
O meu primeiro terno ou costume, já que tinha apenas duas peças, era de calças curtas cor cinza e com riscas de giz. Tirei com ele algumas fotos e fui à missa algumas vezes, ostentando uma gravata borboleta, bem ao estilo da época. É claro que tive outros e sempre era uma história no momento da compra. Minha mãe muito zelosa com as economias domésticas pechinchava exaustivamente para conseguir um bom desconto. Meu pai, ao contrário, não gostava de ser visto com um sovinha e achava que o preço sempre estava adequado.
Meu pai durante toda a sua vida, sempre se preocupou em ter bons ternos para usá-los nos passeios ou mesmo para ir ao centro da cidade para resolver algum assunto cotidiano. Não importava o calor que fizesse, ele suportava elegantemente o paletó e a gravata apertada no pescoço. Muitos anos depois resolvi presenteá-lo com um terno em meu alfaiate. Pedi que escolhesse o melhor tecido disponível no Seu Benedito alfaiate. Esse terno era seu orgulho e pediu-me, discretamente, que queria ser enterrado com ele. E assim se fez. No dia de sua morte fui buscar em sua casa o terno e escolher uma gravata para a sua última viagem. Ao vê-lo bem arrumado no seu último descanso, lembrei-me da história que havia me contado. Bem, e se realmente existir o paraíso, ele não precisará devolver a roupa, como aconteceu com o tal de Gaspar.
DELICIOSAS SUAS CRONICAS...PARABENS!Tomas
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