A proposta inicial era um espetáculo para comemorar os 400 anos de Willian Shakespeare, mas faltaram tempo e recursos. Trazer a obra do genial inglês para o Brasil não era uma tarefa fácil, mas a compositora e cantora Mariane Mattoso encarou o desafio e foi buscar nos sonetos do bardo a inspiração para dez canções bem brasileiras, como valsinhas, marcha-rancho, samba, samba canção, ciranda e até um bolero abrasileirado.
Mas os versos de amor de Shakespeare reservaram uma surpresa, pois o poeta escreveu belos versos de homens apaixonados não apenas para mulheres, mas também para um homem em especial, um jovem e rico nobre que era também o seu mecenas que financiava as produções de suas peças. A bissexualidade do bardo já era comentada nos bastidores dos círculos literários, mas nunca de forma explícita. As velhas traduções dos versos sempre procuraram esconder que os versos eram destinados a um homem ou homens.
A partir dessa descoberta, surgiu a ideia de encenar a história em que aparecia uma misteriosa Dama Negra, bela e, também, poeta que começou a atrair as atenções na Londres renascentista, incluindo o próprio Shakespeare e o nobre mecenas. O tempo passou e da ideia original de uma peça, ficou o show em parceria com ator e cantor Caio Merseguel.
As belas melodias preenchidas pelos versos vertidos, são a tônica do espetáculo. É a língua de Shakespeare roçando a língua de Camões. Enfim, dois poetas quase contemporâneos se encontrando numa terra que queria ser lusitana e não se tornou um imenso Portugal, mas uma latino-américa num grande tacho indígena, com temperos africanos, mas com receitas lusitanas. Hoje, mais misturada ainda com outros europeus, japoneses e tantos outros.
Enfim, Shakespeare ficaria feliz com esse amálgama, ainda mais ele que nunca pensou em viajar para fora da ilha. Nem mesmo na cidade italiana de Verona ele foi, pois lá teria sido o palco seu drama de maior sucesso, Romeu e Julieta, onde se misturam história e ficção, com dois jovens apaixonados morrendo por amor ou de amor.
E a bela voz de Mariane Mattoso, acompanhada em dueto por Caio Merseguel, em canções entremeadas por textos shakespearianos, mostram que o amor pode ser mais plural do que pensa nossa vã filosofia. No show, a dupla também expressa a repulsa contra o racismo, a homofobia, xenofobia e a intolerância. Afinal, o amor não tem barreiras nem fronteiras.
Você conhece alguma Flora? Eu conheci uma, mas não tenho boas lembranças. Ela morava no interior de São Paulo, na pequena Lavínia, minha terra natal. Era a costureira da minha prima e madrinha. Eu ainda era muito criança, mas ainda tenho uma visão clara de sua casa isolada, que ficava no final de uma estrada de terra, ao lado de um velho jequitibá. Era uma construção quadrada, pintada de amarelo e com muitas janelas. Pela minha memória, que pode ser falha, não me lembro de flores em seu quintal. Será que a Dona Flora não gostava de flores? Fui algumas vezes lá com a minha prima, para fazer algumas roupas, numa época em que passei alguns meses em sua companhia. Dona Flora era uma mulher madura e muito séria, que me espetava com o alfinete sempre que fazia a prova das roupas que costurava para mim. Foram poucas vezes, mas o suficiente para deixar uma lembrança amarga da costureira e do seu nome. Mas hoje Flora me lembra a primavera que está chegando e esbanjando cores apesar da chuva
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