Histórias de Piedade
Murilo deu um bocejo e sentiu que já estava passando da hora de fechar a bodega. Fazer as contas, pegar o caminho de casa e descansar para mais um dia de labuta. Já ia pegando a chave quando entrou um velho com uns setenta e poucos anos. O homem chegou meio cambaleando e parou no balcão. Tirou o chapéu e pediu um café bem forte. O Murilo pensou com seus botões, mais essa agora... Na horinha de fechar. Café até que tinha um restinho que havia sobrado, mas servir, sujar copo e ainda agüentar conversa de bêbado? De jeito nenhum.
- Não tem mais café não meu amigo. Acabou.
O homem fez de conta que nem ouviu a resposta do dono do bar e emendou em seguida um novo pedido:
- Então o senhor me faz um misto quente com bastante queijo.
O Murilo já foi perdendo a paciência de Jô e, pedindo desculpas, disse que a chapa já estava fria e que não dava para fazer o lanche não. Bem agora o homem vai embora e eu posso fechar as portas, pensou. Ledo engano, o velhinho não desistiu e mandou outro pedido:
- Me vê então uma coxinha e pronto!
- Eu outra vez vou pedir desculpa pro senhor, mas os salgadinhos acabaram... Respondeu o Murilo já ansioso para encerrar a conversa e fechar o bar. O velhinho olhou bem para o Murilo, passou os olhos pelas prateleiras e disse:
- Ta bom, eu vou embora, mas me responde uma coisa seu moço: Aqui não é bar?
Depois dessa o Murilo ficou sem saber se ria ou chorava. Pensou duas vezes e respondeu calmamente:
- Não senhor, isso aqui é uma farmácia, disse o Murilo um pouco preocupado com a possibilidade de o homem perder a calma.
- Ah! Eu bem que desconfiava; respondeu desanimado. Pegou o chapéu de palha e seguiu o seu caminho.
Lá fora a lua estava bonita e a noite prometia ser fresca e clara. Ao trancar a porta olhou para a estrada e ainda viu o homem caminhando em ziguezague. A gente vê cada uma neste mundo de Deus! Pensou em voz alta o Murilo. Cansado e precisando de um bom banho para relaxar, também pegou a estrada e foi seguindo a lua nova que brincava faceira de se esconder pelas colinas da cidade.
Chegando em casa ainda tomou um gole de uma cachaça especial que ganhou de um amigo que trouxe de Minas, não sem antes ouvir a mulher reclamar. Tomou um banho demorado e resolveu contar o acontecido para a patroa.
Terminando de contar o causo, começou a rir sozinho como uma criança. A mulher deu de ombros e perguntou: “Uai que graça tem isso, sô?” Pois é Murilo, têm histórias que só vendo e ouvindo pra rir. Contando assim não tem graça não. E o Murilo foi dormir lembrando do velho.
Renato Ladeia
Murilo deu um bocejo e sentiu que já estava passando da hora de fechar a bodega. Fazer as contas, pegar o caminho de casa e descansar para mais um dia de labuta. Já ia pegando a chave quando entrou um velho com uns setenta e poucos anos. O homem chegou meio cambaleando e parou no balcão. Tirou o chapéu e pediu um café bem forte. O Murilo pensou com seus botões, mais essa agora... Na horinha de fechar. Café até que tinha um restinho que havia sobrado, mas servir, sujar copo e ainda agüentar conversa de bêbado? De jeito nenhum.
- Não tem mais café não meu amigo. Acabou.
O homem fez de conta que nem ouviu a resposta do dono do bar e emendou em seguida um novo pedido:
- Então o senhor me faz um misto quente com bastante queijo.
O Murilo já foi perdendo a paciência de Jô e, pedindo desculpas, disse que a chapa já estava fria e que não dava para fazer o lanche não. Bem agora o homem vai embora e eu posso fechar as portas, pensou. Ledo engano, o velhinho não desistiu e mandou outro pedido:
- Me vê então uma coxinha e pronto!
- Eu outra vez vou pedir desculpa pro senhor, mas os salgadinhos acabaram... Respondeu o Murilo já ansioso para encerrar a conversa e fechar o bar. O velhinho olhou bem para o Murilo, passou os olhos pelas prateleiras e disse:
- Ta bom, eu vou embora, mas me responde uma coisa seu moço: Aqui não é bar?
Depois dessa o Murilo ficou sem saber se ria ou chorava. Pensou duas vezes e respondeu calmamente:
- Não senhor, isso aqui é uma farmácia, disse o Murilo um pouco preocupado com a possibilidade de o homem perder a calma.
- Ah! Eu bem que desconfiava; respondeu desanimado. Pegou o chapéu de palha e seguiu o seu caminho.
Lá fora a lua estava bonita e a noite prometia ser fresca e clara. Ao trancar a porta olhou para a estrada e ainda viu o homem caminhando em ziguezague. A gente vê cada uma neste mundo de Deus! Pensou em voz alta o Murilo. Cansado e precisando de um bom banho para relaxar, também pegou a estrada e foi seguindo a lua nova que brincava faceira de se esconder pelas colinas da cidade.
Chegando em casa ainda tomou um gole de uma cachaça especial que ganhou de um amigo que trouxe de Minas, não sem antes ouvir a mulher reclamar. Tomou um banho demorado e resolveu contar o acontecido para a patroa.
Terminando de contar o causo, começou a rir sozinho como uma criança. A mulher deu de ombros e perguntou: “Uai que graça tem isso, sô?” Pois é Murilo, têm histórias que só vendo e ouvindo pra rir. Contando assim não tem graça não. E o Murilo foi dormir lembrando do velho.
Renato Ladeia
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