Conheci o velho Constantino há mais de vinte anos. Foi-me apresentado pelo seu filho numa festa de aniversário de um dos seus netos. Era um homem esguio, de porte elegante e muito alegre. Era um ítalo-caipira, com o seu jeito sorrateiro de observar as pessoas e sugeria, ainda que não fosse fumante, estar sempre picando um fumo de corda e enrolando numa palha sem fim. Rapidamente, como se fossemos velhos amigos deu-se a me contar causos. Alguns um tanto escabrosos, como o do bando de assombrações que vivia a infernizar a vida do povo de Butiá, um vilarejo de Descalvado no interior do Estado de São Paulo, onde nasceu e morou. Contou-me a história com um sorriso maroto nos lábios, saboreando cada palavra, cada passagem, como quem come um cuscuz bem feito. “Rapaz eu nunca tive medo de assombração, mas daquela vez me arrepiei todo. Os companheiros saíram em disparada largando sanfona, violão e até as botinas pela estrada. Eu fiquei firme, segurando minha flauta. Eu não corro de vivo, vou correr de morto!”.
Constantino era um mestre contador de histórias e Butiá era seu palco preferido onde passou sua infância e juventude. Lá aconteceram os grandes bailes, as conquistas amorosas, as brigas de foice e facão e as fugas atabalhoadas pelas invernadas. Eram histórias de valentias dignas da melhor literatura de cordel.
Em todas as festas em que estava presente tomava conta da cena, pois ninguém deixava de ouvir as suas histórias e anedotas bem humoradas. No dia em que nos conhecemos falávamos da aridez da cidade, sem flores, sem campos e sem poesia, quando ele contou-me sobre as flores e as rosas que sua mãe cultivava na fazenda da família, chamada Caucaia do Alto, em Butiá. Toda a vizinhança admirava suas flores e ela sempre repetia os versinhos: “Quem não tem jardim na frente/ não vem de boa gente”. Foi assim que cresceu o Constantin, sob o olhar severo da mama e a beleza de suas flores que ele aprendeu a amar e respeitar.
A velha Butiá, como os velhos amigos, aos poucos também vai desaparecendo, ficando apenas um quadro esboçado na parede da casa do Sinésio, filho do Constantino, mas continua arranhando nossos corações com velhas lembranças. Quando lá estive, há mais de vinte anos, fiquei imaginando um bando de rapazes tocando e cantando pelas estradas para espantar o medo atávico de assombrações. E na minha imaginação o nosso querido Constantino estava entre eles, rindo e assustando os demais com seus causos do além.
E foi pra lá que ele voltou, graças ao filho pródigo que cumpriu o último desejo do pai. “Como eu não sou de pedra e algum dia morrerei, na minha Butiá, meus despojos deixarei”. Imagino que foi assim o pedido do Constantino, pois ficaria mais perto das flores de sua mãe que há tempos florescem na dimensão da poesia, dos velhos campos repletos de butiás que balançam com o antigo vento que sopra do sem fim e dos velhos companheiros de bailes e aventuras. Mas... Para terminar essas mal traçadas linhas, já que a emoção me impede de prosseguir, recorro a uns versos quase anônimos como epitáfio para o querido amigo que partiu: “Butiá, Butiá, de longe não posso chorar/ pois meu coração ficou naquele lugar”.
Renato Ladeia
Constantino era um mestre contador de histórias e Butiá era seu palco preferido onde passou sua infância e juventude. Lá aconteceram os grandes bailes, as conquistas amorosas, as brigas de foice e facão e as fugas atabalhoadas pelas invernadas. Eram histórias de valentias dignas da melhor literatura de cordel.
Em todas as festas em que estava presente tomava conta da cena, pois ninguém deixava de ouvir as suas histórias e anedotas bem humoradas. No dia em que nos conhecemos falávamos da aridez da cidade, sem flores, sem campos e sem poesia, quando ele contou-me sobre as flores e as rosas que sua mãe cultivava na fazenda da família, chamada Caucaia do Alto, em Butiá. Toda a vizinhança admirava suas flores e ela sempre repetia os versinhos: “Quem não tem jardim na frente/ não vem de boa gente”. Foi assim que cresceu o Constantin, sob o olhar severo da mama e a beleza de suas flores que ele aprendeu a amar e respeitar.
A velha Butiá, como os velhos amigos, aos poucos também vai desaparecendo, ficando apenas um quadro esboçado na parede da casa do Sinésio, filho do Constantino, mas continua arranhando nossos corações com velhas lembranças. Quando lá estive, há mais de vinte anos, fiquei imaginando um bando de rapazes tocando e cantando pelas estradas para espantar o medo atávico de assombrações. E na minha imaginação o nosso querido Constantino estava entre eles, rindo e assustando os demais com seus causos do além.
E foi pra lá que ele voltou, graças ao filho pródigo que cumpriu o último desejo do pai. “Como eu não sou de pedra e algum dia morrerei, na minha Butiá, meus despojos deixarei”. Imagino que foi assim o pedido do Constantino, pois ficaria mais perto das flores de sua mãe que há tempos florescem na dimensão da poesia, dos velhos campos repletos de butiás que balançam com o antigo vento que sopra do sem fim e dos velhos companheiros de bailes e aventuras. Mas... Para terminar essas mal traçadas linhas, já que a emoção me impede de prosseguir, recorro a uns versos quase anônimos como epitáfio para o querido amigo que partiu: “Butiá, Butiá, de longe não posso chorar/ pois meu coração ficou naquele lugar”.
Renato Ladeia
Boa tarde REnato!
ResponderExcluirObrigado por retratar de maneira tão fiel o jeito do meu querido avô.
Um abraço
Constantino Dozzi Tezza Neto
Lembrei do seu Constantino e muito de Butiá e mais ainda do Oscar e Castro Alves...qualquer dia te escrevo sobre Butiá.
ResponderExcluirAbr. Geanete