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Mostrando postagens de julho 4, 2021

SALVE O DIA DA BANDEIRA!

A bandeira brasileira tem um velho e saudoso significado para mim. Lembra minha mãe com uma saia de linho verde que ela gostava de usar e a deixava elegante e charmosa. Mas um dia ela enroscou a saia em algum lugar, fazendo um rasgo irrecuperável. Ficou triste, muito triste. E para consolá-la pedi que me fizesse uma camisa com o tecido. Não é ela topou! Mãos a obra. Sentada em sua Brivenix, uma máquina de costura inglesa, onde eu li as primeiras palavras na língua de Shakespeare: Made in England, ela costurou, em poucas horas uma bela camisa de linho verde. A cor me deixava preocupado, pois poderia sugerir que eu havia trocado de time, abandonando o velho clube do Parque São Jorge, mas eu gostava do verde e ponto final. Mas um fato novo estava para acontecer. A minha professora do segundo ano primário avisou que no dia seguinte comemoraríamos o dia da Bandeira Nacional e nos fez decorar o quase desconhecido hino, cujos versos ainda me encantam: “Salve lindo, pendão da esperança/ Salv

AS CATARATAS

Nunca visitei as Cataratas do Iguaçu e tampouco as do Niágara, mas descobri na última consulta ao oftalmologista, que apareceu uma “em minhas retinas fatigadas”, como diria o velho Drummond. É pequena e apenas no olho direito, mas suficiente para deixar a visão embaçada. Ainda bem que é apenas em um olho, pois caso contrário não estaria conseguindo escrever esse texto. A catarata, para quem não sabe, é a perda do cristalino, que tem um papel importante na formação da imagem na retina. Mão sei se foram as cataratas dos rios que deram o nome para as dos olhos ou o contrário. A palavra vem do grego Katarakte que significa coisa que cai. Os antigos acreditavam que o humor do organismo escorria para os olhos. A danada ocorre por conta do vencimento do prazo de validade do ser humano. Quem passar dos sessenta terá a sua. Preparem-se... A cirurgia para a retirada da catarata é antiga e já era conhecida entre os egípcios, mas com pouquíssima eficiência. Somente no século XVIII, o oftalmologi

DIÁRIO DA QUARENTENA

Acordo com a sensação de que o fim de semana não tem mais fim. Parece que estamos emendando um com o outro e desapareceram as segundas, terças, quartas... Terminamos o Verão, o outono e estamos entrando no Inverno e tudo parece igual, com as mesmas folhas da quaresmeira inundando o quintal. Felizmente não estamos sozinhos, pois filha, genro e neto ajudam a passar o tempo, principalmente o menino arteiro que todos os dias aparece com uma nova artimanha para deixar todos de cabelos em pé. Minha rua é pequena e sem saída. O movimento maior é por conta do caminhão de lixo que passa quatro vezes por semana, sendo uma de material reciclável. Esses materiais aumentaram bastante, pois temos comprado tudo por telefone. A padaria fez até umas graças enviando de brinde potes de café gourmet do Vale do Paraíba, mas pararam, pois, deve ter acabado o estoque. Alguns vizinhos saem para a rua sem máscaras e parecem pouco preocupados com a pandemia. Reconheço que pelo movimento da rua, não correm nen

CORAÇÕES SUJOS

Acabei de ler o livro Corações Sujos do Fernando Moraes sobre a comunidade japonesa no Brasil nos anos 1940, durante a Segunda Guerra Mundial. Mesmo depois do ataque americano com bombas atômicas sobre e Hiroxima e Nagasaki, muitos japoneses residentes no Brasil ainda acreditavam que o Japão havia vencido a guerra e que as informações que aqui chegavam eram manipulações do imperialismo americano. Aqueles que não concordavam que o Japão havia vencido a guerra eram chamados de "Corações sujos" e muitos foram assassinados como traidores da pátria do Sol Nascente. No oeste paulista, onde estava grande parte da colônia, esse sentimento era muito forte, causando sérios problemas, obrigando a polícia a intervir de forma muitas vezes violenta e desproporcional. A repressão criou um sentimento entre os japoneses de que os brasileiros não gostavam deles. Fazendo uma analogia com a atualidade, a informação de que o Japão teria sido o vencedor da guerra, era uma fake news e aqueles q

DESIGN INTELIGENTE

Design inteligente é um conceito que tenta se contrapor à Teoria da Evolução formulada por Charles Darwin no século XIX, argumentando que houve sim uma evolução, mas orientada por um criador do universo que já tinha em mente como seriam os seres vivos na Terra. Essa visão não tem base científica, pois admite, a priori, que tudo se deu pela vontade expressa de um possível criador do universo. Ao contrário, a Evolução se torna uma teoria a partir das comprovações empíricas de Darwin que observou mudanças em algumas espécies em função das necessidades da adaptação e seleção natural. O assunto vem à tona em razão de um congresso “científico” organizado pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul em que um químico defende de forma apaixonada o Design Inteligente, tentando desconstruir a Teoria da Evolução de Darwin que é aceita pela maioria dos pesquisadores. Essa expressão surgiu após a Suprema Corte dos USA considerar o criacionismo uma visão religiosa, sem nenhuma base científica.

QUE MISTERIOS TEM CLARICE e os 80 anos de Clarice Herzog

Em outubro de 1975, era assassinado nos porões da ditadura, o jornalista de origem judaica, Vladimir Herzog, logo depois que ele se apresentou para atender a uma intimação. Avisou sua mulher que iria se apresentar e não estava muito preocupado, pois não tinha cometido nenhum crime, pelo menos no seu modo de ver as coisas. Não voltou mais e algumas horas depois Clarice recebia a notícia de que ele havia se “suicidado”. A família Herzog que saiu da Iugoslávia para fugir do antissemitismo alemão durante a guerra e perdera um filho nas circunstâncias mais absurdas. A notícia comoveu o país e o mundo, pois Herzog era diretor de jornalismo da TV Cultura, um canal do governo do Estado de São Paulo. Na época, o presidente da República era o General Ernesto Geisel e o governador o empresário Paulo Egydio Martins, escolhido pelo presidente. O Secretário da Cultura era o empresário José Mindlin, dono da Metal Leve, também judeu, a quem Herzog era subordinado. A morte de Herzog teve grande reper

LULA E O SONHO DE BOLSONARO

Pode parecer estranho que Bolsonaro torça para que Lula seja de fato o seu adversário em 2022, pois o petista, de acordo com as pesquisas de opinião, tem grandes chances de derrotá-lo no segundo turno. Um candidato mais ao centro no segundo turno poderia, em tese, atrair os votos do centro, centro direita, direita e centro esquerda, ampliando as chances de vencer Bolsonaro no segundo turno. É bom não esquecer que em 2018 Bolsonaro surfou na onda do antipetismo depois do fracasso político e econômico da Dilma Rousseff e dos processos da operação lava-jato que atingiram Lula e o PT. Muitos eleitores de centro ou da maioria silenciosa, votaram nele por falta de opção. No entanto, depois do seu desastrado governo, Bolsonaro dificilmente receberia novamente todos esses votos, a não ser que os mais conservadores fiquem entre a cruz e a espada. Enfrentando Lula no segundo turno Bolsonaro deve estimular seus partidários e os eleitores conservadores de que ele seria a única opção contra um c

O LADO PRECONCEITUOSO DOS ARGENTINOS: O PAPA E O PRESIDENTE

Os argentinos estão em alta na produção de declarações racistas, preconceituosas e estereotipadas. O simpático Papa Francisco respondeu em forma de piada que os brasileiros não tinham salvação, pois ao invés de orar, ficam bebendo cachaça. A percepção argentina de que os brasileiros são cachaceiros é menos ruim do que quando nos chamam de macacos em razão da forte presença africana no Brasil. Não bebo cachaça, uma bebida nacional com registro de origem, muito apreciada no mundo inteiro, mas ela deve ter lá suas qualidades exaltadas pelos cachaçaciers. Um velho amigo, Silvio Franco, lançou várias cachaças com sabores, sendo a de Cambuci, uma das mais apreciadas. A “Reserva do Cabrunco”, tem também, a cachaça com uvaia entre outras. Recordo-me de uma multinacional alemã onde trabalhei, em que as secretárias corriam em desespero atrás de boas cachaças para seus chefes levarem nas bagagens, pois seria indelicadeza voltar do Brasil sem os esperados presentes para os amigos e parentes. Ma

MARISA DEA. POR QUE TÃO CEDO?

MARISA DEA. POR QUE TÃO CEDO? Conheci a Marisa como professora de literatura brasileira na Fundação Santo André. Cursei dois anos e desisti do curso de Letras, mas não esqueci das aulas dela, principalmente quando analisamos um poema do Drummond, A flor e a náusea, que ela considerava a sua obra prima. Outra aula inesquecível foi sobre o conto “’O Iniciado do Vento”, de Aníbal Machado, um grande escritor mineiro pouco conhecido, mas genial. Marisa sempre lembrava os escritores franceses, principalmente os poetas como Racine e Mallarme, que eram citados a larga. Depois de formado fui dar aulas num colégio estadual em São Caetano do Sul como mestre em caráter precário. Lá encontrei novamente a Marisa, que era professora concursada do estado. Tivemos longos papos na sala dos professores, sempre falando de literatura, principalmente Drummond, Fernando Pessoa, Flaubert, Balzac entre outros. Fiquei apenas um ano no colégio, pois era muito estressante ter dois empregos e optei por ficar apen

STRANGE FRUIT E BILLIE HOLLIDAY

O filme “Billie Holiday contra o Estado” tem como tema a perseguição sofrida pela cantora de jazz pelo departamento de narcóticos do FBI nos anos 1940 e 1950. Billie era mesmo viciada em heroína, mas a perseguição tinha um foco mais pessoal, pois a cantora representava, aos olhos do Estado, uma ameaça à estabilidade política e social e o comissário tinha como objetivo maior, destruir a artista, pois sua voz tinha uma força, uma penetração muito grande entre os seus irmãos negros. Holiday, nascida em 1915, filha de pais adolescentes, teve uma infância trágica, pois com dez anos foi estuprada por um vizinho. Com catorze anos começa a se prostituir para sobreviver, mas é presa e passa quatro meses na prisão. Aos quinze anos começa a cantar em bares até ser descoberta. Para a polícia e o stablishment, a canção Strange Fruit era perigosa, pois poderia estimular a revolta. Revolta der quem? Obviamente dos negros massacrados pelo apartheid americano. Strange Fruit composta pelo professor ju

NÃO VERÁS PAÍS NENHUM

O livro do novo imortal da Academia Brasileira de Letras, Ignácio Loyola Brandão, estava em minha estante desde 1981 e só agora, em plena pandemia, resolvi enfrentá-lo. Não é fácil, pois o romance narra com profundo pessimismo o futuro do país. Quem leu O Processo de Franz Kafka, 1984 de George Orwel e o Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley, deve saber do que se trata. Dá a impressão de que Brandão se inspirou nesses três clássicos da literatura para construir sua narrativa. O mundo brandonista, termo que estou lançando (rs), seria caótico, pois o clima estaria totalmente mudado com a seca atingindo a grande parte do planeta, rios com leitos secos, as chuvas teriam desaparecido e as florestas teriam ficado como reles lembranças nos livros didáticos ou na memória dos mais velhos. O mundo estaria se alimentando basicamente de alimentos que o autor chama de factícios, pois seriam produzidos em laboratórios com todos os riscos para a saúde humana. A floresta amazônica hoje cantada em p