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RELEMBRANDO OS TEMPOS DE COLÉGIO OU A PARTIDA DA MARCIA EDWIGES DE OLIVEIRA.

Passados longos anos, já beirando a aposentadoria, às vezes dá vontade de saber por onde anda aquela turma do colegial, uma fase gostosa da vida em que estávamos todos querendo descobrir e consertar o mundo. Era muita alegria, descompromisso com o futuro ou com o presente. Por Essas e outras, num dia desse outono que começa a dar as caras, resolvi dar uma espiada nas redes sociais para ver se encontrava alguém. E os nomes? Muitas mulheres mudam de nome quando casam e muitos não estão sintonizados com a tecnologia da informação. Lembrei-me de alguns e comecei a pesquisar. Qual o quê! Encontrei uma que era uma garota deslumbrante, inteligente culta e que gostava das mesmas músicas e mesmos autores que eu ouvia e lia. Cheguei até pensar que poderia rolar alguma coisa, mas ficou apenas na amizade. Depois descobri que ela não tinha nada a ver comigo. Éramos pessoas muito diferentes.  Encontrei, também, duas irmãs, a Maria Auxiliadora e a Márcia Edwiges de Oliveira.  Eram pessoas bacanas, inteligentes, simpáticas e cheguei a freqüentar a casa delas, almoçando ou jantando. A madrasta era muito simpática e era bastante agradável com os amigos das enteadas.
               A casa da Maria Auxiliadora e da Márcia Edwiges era o lugar onde uma parte da turma ia estudar para as provas nos fins de semana, principalmente porque a Maria era craque em matemática, física e química, que, diga-se de passagem, não era o meu forte. Foram bons tempos em que mais conversávamos sobre tudo e bem menos sobre as matérias que precisávamos estudar. Havia também outra amiga da época, a Vera Lúcia da Silva, que encontrei tempos depois numa reunião do colégio onde minha filha estudava. Virou professora de biologia, área em que era muito boa aluna nos tempos de colégio. Nunca cheguei a pensar que um dia pudesse encontrar uma amiga de escola dando aula para minha filha. Sempre me lembrei da Vera por causa do livro Cem Anos de Solidão do Garcia Marques que lhe emprestei e ela se esqueceu de me devolver. Não que tivesse problemas com isso, mas sempre que procurava o livro para reler vinha à memória a lembrança da Verinha, uma pessoa especial.
               Voltando ao Facebook, solicitei as duas irmãs para me adicionarem na rede. A Maria aceitou, mas até a publicação dessa crônica não havia enviado nenhuma mensagem ou comentário. Como a Márcia não respondeu, por curiosidade, fui dar uma espiada na sua página e descobri que ela não estava mais entre nós. Faz pouco mais de três meses que ela partiu. Lembrei-me dela com o carinho que tinha por toda a turma. Ela era uma garota bonita, cabelos castanhos claros (ou eram loiros?) e vivos olhos azuis. Soube tempos depois que namorou o Pedro Luiz Montini, também da nossa turma, com o qual tive um contato pelo Linkedin. Da Márcia recordei um fato pitoresco, para não dizer desagradável, que quase acabou com a nossa amizade. Vamos à história. Resolvi dar-lhe uma lembrança pelo aniversário e comprei uma caixa de bombons de boa marca e deixei na gaveta de minha mesa onde trabalhava. Um sujeito bastante cafajeste que trabalhava no departamento, sorrateiramente, substituiu os bombons por pedaços de sabão embrulhados com papel higiênico e deixou o pacote embrulhado como veio da loja. À noite, inocentemente, entreguei o que seria a caixa de bombons para a Márcia e não falei mais com ela depois. Somente no dia seguinte fui questionado pela Vera Lúcia porque eu teria feito aquela brincadeira de mau gosto. Foi um choque e ainda bem que não encontrei o tal sujeito naquele momento, pois seria capaz de estrangulá-lo de tão furioso que fiquei. Bem, consegui reaver os bombons e entreguei-os a ela com mil pedidos de desculpas. Como ela era uma pessoa generosa, distribuiu para os colegas mais próximos.

               Terminado o colégio, nunca mais falei com o pessoal. Cada um foi para um lado, seguindo carreiras diferentes. Na faculdade encontramos novas pessoas, fazemos novas amizades e esquecemos aquela fase da vida. É uma pena, pois amigos nunca são demais, nem que seja para um telefonema, contar as novidades boas e as ruins que ocorrem na estrada da vida. Apesar do longo tempo sem contato, confesso que senti um aperto no peito ao saber da morte da Márcia, uma pessoa tão cheia de vida, tão doce e cujo sorriso encantava a todos.  Pode ser que outros já tenham deixado esse pequeno planeta azul e quem sabe se encontrem nas tardes da eternidade para contar piadas ou declamar poemas do Fernando Pessoa que aprendemos na escola.

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