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Mostrando postagens de novembro, 2010

ALBUM DE RETRATOS E O VELHO RIO DE JANEIRO

Catete Estrada da Gávea                                                                    Revendo um velho álbum de retratos da família, encontrei  uma foto desgastada pelo tempo do meu tio Elisiário Ladeia  no longínquo ano de 1929. Era mês de julho e ele  posava numa fotografia para enviar de lembranças para a família que residia em Araçatuba, São Paulo. Com sua letra miúda e caprichada, ele escreveu: “Para o meu bom pai, uma lembrança do seu filho na Avenida Atlântica, capital da República”. Ele trabalhava como guarda-livros em um banco e morava na residência de um médico parente de minha avó. Guarda-livros era o nome que se dava para os contadores antigamente. Quando se contava a história lá em casa eu ficava imaginando que ele passava os dias tomando conta de livros, um bibliotecário. E lá estava meu tio em branco e preto curtindo as praias cariocas  enquanto o crack da  bolsa de Nova Iorque liquidava com  grandes fortunas.  Milioná

UM SUJEITO DE BEM COM A VIDA

Algumas pessoas se tornam lendárias em nossas memórias, principalmente aquelas que conhecemos em nossa juventude. É o caso do Ademir Bellucci, amigo dos tempos de faculdade. Era um sujeito de boa pinta, louro de olhos azuis, que fazia algum sucesso com as mulheres apesar de ser deficiente físico. Ele perdeu a mão quando garoto trabalhando em um açougue em sua cidade natal. Nunca se queixou com relação ao problema e ao contrário, gostava de brincar com a deficiência sem o menor constrangimento. Se alguém contava uma anedota de maneta, ele mostrava  o toco de braço e brincava com a própria desgraça. Fez isso com um amigo, o Erasmo, que chorou copiosamente ao ver que ele era maneta. As pessoas é que ficavam profundamente constrangidas com o seu defeito físico e muitas vezes ele, sem maldade,  tirava proveito dessa condição. Quando trabalhava no departamento de Estatística do Estado como estagiário, mostrava o toco e a chefe toda emocional, chegava às lágrimas quando ele contava, p

NEGÓCIOS E OPORTUNIDADES

Numa manhã ensolarada de primavera a campainha tocou. Era um casal bem apresentável. Ele de terno e gravata e ela vestida com uma saia e blusa bem combinadas. Pensei tratar-se de pregadores evangélicos, o que é muito comum nos fins de semana em meu bairro. Pediram-me um minuto de atenção. Dispus-me, educadamente, a ouví-los, considerando que estava de bom humor por causa do belo dia e pelas flores exuberantes do quintal. “Estamos fazendo uma oferta especial para pessoas de alto nível como o cidadão. Trata-se de um excelente lote no cemitério da Eternidade. É uma oportunidade única para pessoas que pensam no futuro”. Ao ouvir aquele discurso empolado e falso, desatei a rir. Tentei me conter, mas sem sucesso. O casal não entendeu nada e como não conseguia parar de rir, os dois deixaram um prospecto e foram embora, visivelmente irritados com a minha falta de cortesia. Na realidade a frase do vendedor não tinha  nada de engraçado, mas o fato é que me lembrei de uma pitoresca  história

A DESPEDIDA DO POETA (Delcy Thenório 1926-2010)

                                          Delcy Thenório com seu filho Edélcio Thenório O último encontro que tive com o poeta  Delcy Thenório, foi em sua casa em Santo André, para um café, tradição da família nos domingos à tarde. Foi um longo e prazeroso encontro. Conversou-se sobre tudo, até mesmo como preparar um bom café e quase todos os presentes se apresentaram como bons baristas, cada um com o seu jeito peculiar de preparar a bebida que é a preferência nacional. Até o Zeca, que todos sabem não conhecer os segredos de um bom café, deu lá os seus palpites. Boas anedotas correram soltas, sob o olhar distante da Antonieta que fingia entendê-las e esboçava um sorriso complacente. Falou-se muito de poesia e é claro, dos versos do Delcy, cuja sagacidade provocava gargalhadas descontraídas. Até o Elcio, seu filho, um bom vivant, presenteou-nos com um belo poema que compôs sobre a velha Itália. Surpreendeu a todos, ficando a leve suspeita de que os pendores poéticos são

CAFÉ LUÁ

Trinta anos sem o Café Luá O pessoal da velha guarda do ABC deve lembrar com saudade do velho Café Luá, na Rua Manoel Coelho, em São Caetano, no final dos anos 70. Era um misto de um café parisiense com bar carioca dos tempos da bossa nova. A arquitetura do espaço era bem concebida, com um mezanino de onde se podia avistar o palco, onde sempre bons músicos estavam lá para proporcionar aos freqüentadores o que havia de melhor na música popular brasileira. Os cafés servidos eram sofisticados e com uma imensa variedade, atendendo aos gostos mais refinados. E não faltavam os chás que podiam ser degustados pelos abstêmios ou após uma noitada pesada quando a madrugada dava os seus últimos suspiros antes dos primeiros raios de sol penetrarem pelas amplas janelas. O Zeca, sócio e idealizador do espaço era um perfeito anfitrião, estando sempre a postos para recepcionar os velhos amigos. Como o lema do Café Luá era “Até o último freguês”, isso lhe custou sérios problemas. O primeiro fo